sexta-feira, 27 de novembro de 2009


O que é um psicanalista?*

*texto publicado no Caderno Estilo do Jornal de Jundiaí em 15/11/09
Vira e mexe, perguntam: “Por que pagar a um profissional, se posso conversar de graça com o pastor ou com a mãe-de-santo? Os meus melhores amigos não me entendem mais que um desconhecido? Afinal os meus pais não saberiam o que é bom pra mim? Qual a diferença entre o padre que escuta e aconselha, e um psicanalista?”
A diferença é: o psicanalista é formado em psicanálise, os outros não. E aí, insistem: “Formado como?”
Cabe esclarecer que a psicanálise não faz parte da psicologia, pois são duas ciências diferentes. A psicanálise é a ciência do inconsciente que foi fundada por Sigmund Freud (1856 – 1939). Um método de investigação, que consiste essencialmente em evidenciar os significados inconscientes das palavras, das ações, das produções imaginárias (sonhos, fantasias, delírios) de um sujeito, que os desconhecendo sofre e faz sintomas que atormentam sua vida. A formação preconiza que o psicanalista se submeta ao mesmo processo que é proposto a seus pacientes – análise pessoal do analista. E isso é uma espécie de precaução: é preciso evitar que interfiram nos tratamentos, motivações do analista que ele mesmo desconhece.
Além disso, entender as motivações do sofrimento psíquico dos outros será proporcional ao entendimento que o analista possue de si mesmo, que teve coragem de encarar em seu processo de análise. Um psicanalista sério e comprometido com seu ofício tem a disposição para encontrar dentro de si as inquietações mais turvas e cicatrizes mais supuradas. E por quê? Da sua análise pessoal depende sua capacidade de escutar, algo bem mais complexo que ouvir no sentido da audição. A prática clínica de um tratamento psicanalítico implica, para o analista, um esforço significativo que consiste em suportar “visitar” os porões assutadores e, muitas vezes desesperadores, do passado infantil de seus pacientes.
Acreditamos, então, que para lidar com o sofrimento mental humano é necessário uma formação profissional, porque não se trata simplesmente de conversar com outra pessoa, por mais querida ou bem intencionada que seja, e que ao ouvir nossas aflições, angústias e dúvidas ela poderá nos ajudar. É preciso tratar a causa desse sofrer que se expressa no mal estar. É preciso encarar os demônios de nossa alma de frente, cuidar deles. Não fazê-los calar, fazê-los falar no lugar aonde poderão encontrar o sentido de suas manifestações. Os outros pontos da formação são o estudo da teoria psicanalítica e a discussão da prática com um psicanalista mais experiente.
Nesse sentido, o TRIEP é uma instituição que propõe a transmissão e divulgação da psicanálise. Reúne profissionais da área de saúde mental que buscam desenvolver esses pontos da formação de um psicanalista: o aprofundado estudo do pensamento de Freud e de autores da atualidade, a supervisão da clínica e o incentivo à análise pessoal do psicanalista. Entendemos que a prática clínica deve estar vinculada, também, a uma reflexão teórica e prática que torne possível a construção do lugar de escuta do psicanalista.
Freud em um dos seus textos afirmou que “nenhuma regra a respeito da felicidade vale para todos. Cada um deve buscar por si mesmo a maneira em que possa ser feliz.” O sofrimento psíquico não é coisa fácil, e precisamos de ajuda para desempedir o caminho obstruído da própria felicidade. Do analista se pode esperar interpretações que levem o analisando à produção de verdades sobre si, sobre seus sintomas, seus medos e suas dificuldades na vida.

Daisy Maria Ramos Lino